Psicólogo Clínico Gestalt-terapeuta
CRP 12/07911
Senti um aperto no coração. Era isso. Um nó na garganta que eu teria que aguentar. Senti meus olhos arderem. Ainda era um sentimento estranho. Enraizado em noites e dias tão profundos quanto os meus sonhos abissais.
Respirei. Tentei disfarçar as batidas que vinham de dentro do meu peito. Lembrava-me da primeira vez que a vira. Tantos anos passaram, mas, parecia que tudo aconteceu ontem. Fora no outono de 1995.
Era um tempo de incertezas. Uma nova moeda nacional, velhos e novos desempregados, nuvens espessas que encobriam o céu de desânimo.
Eu ainda era apenas um estudante, mas pensara em arranjar qualquer espécie de emprego para ajudar nas despesas de casa. Eu tinha 15 anos e meus amigos queriam acampar naquele final de semana. Morava em uma cidade do interior e isso era quase que habitual entre os jovens, acampar. Levaria a comida que tínhamos em casa, macarrão, ovos, conservas, café e leite. Depois passaríamos em uma vendinha para comprarmos cigarros.
Seria um final de semana como outro qualquer. Reuniríamos os amigos e em torno de uma fogueira entre brindes e tragadas conversaríamos e nos divertiríamos à nossa maneira. Falaríamos coisas estúpidas, pois éramos tão jovens.
Quando pisei fora da venda e risquei o isqueiro, olhei por sobre o cigarro que em minha boca estava... Levei algum tempo para apreender o que via. E aquilo atingiu meu coração.
Os cabelos loiros escorriam por debaixo daquela boina preta, contornavam-lhe a límpida face e seus lábios escarlates entreabertos mostravam seus alvos dentes. As orelhas pequenas passavam despercebidas àqueles lindos olhos castanhos que delineavam a face. Olhos quentes resplandecentes que acompanhavam uma paixão que eu não conseguia compreender.
Procurei ver o que naqueles olhos havia. Já estava com o cigarro em uma das mãos. Olhos que não se deixavam ser totalmente lidos.
Ela desviou os olhos quando passou pela minha frente. Eu apenas a fitei.
Acompanhei seu rastro de perfume deixado para trás. Não pude sequer dar uma tragada em meu cigarro, era como se o meu corpo não respondesse mais a mim.
Foi quando ela se virou por completo e me sorriu. Aquilo foi uma espécie de um golpe violento e explosivo que me atingiu direto à alma. Os lábios dela se moviam. E a paixão tomou conta do meu corpo de inocência.
Amamos-nos, nos encontramos e por vicissitudes nos perdemos.
Dezenove anos se passaram. Fazia tanto tempo... Tanto tempo. Os nossos olhos se cruzaram novamente. Ela passou por mim.
Era o mesmo andar gracioso. Lembrava seu cabelo liso, agora um pouco mais ondulado, mas era o mesmo cabelo solar.
Já fazia tanto tempo...
Ajustei a respiração junto ao compasso das batidas do meu coração. Eu estava quase explodindo com todos aqueles sentimentos que um dia me invadiram.
Ela era uma mulher que trazia a paixão em si. Carregava o sexo em torno de si e aos olhos alheios. Seus lábios, seus olhos, suas pernas, seu sorriso, sua paixão, seu desejo, eram algo que nenhum homem ou mulher podiam deixar de senti-los.
Nossos olhos sorriram. Fazia tanto tempo que nos perdemos... Não! - pensava. Nunca havíamos nos perdido, então nos reencontramos e nos amamos.
Ela menina mulher. Criança crescida. Mulher que descortina sonhos. Menina mulher de pulos, saltos e alegrias, que irradia os dias de outono à descoberta dos teus encantos. Que se deixa encontrar nos olhos de outros olhos. Dentro desta mulher existiu e existirá sempre uma menina crescida.