Henrique Fendrich (Crônica de São Bento)
Jornalista são-bentense residindo em Brasília/DF
Antes de ser uma travessa, José Zipperer foi um dos imigrantes pioneiros de São Bento do Sul. Como sempre tive curiosidade de saber mais sobre a nossa história, aproveitei minha última ida a São Bento para visitar o Pai Fritz. Exercendo espantosos talentos da mediunidade, Pai Fritz colocou-me em contato com José Zipperer e intermediou uma entrevista que, para conhecimento de todos, reproduzo a seguir.
Bom dia, José Zipperer. Como foram os primeiros anos de São Bento?
Penosos e amargos foram os primeiros tempos para os imigrantes, afastados de qualquer socorro ou assistências médicas, tudo dependendo deles mesmos.
Mas não era isso que vocês diziam nas cartas aos parentes na Europa.
Nas cartas, pintávamos tudo nas melhores cores possíveis, e creio que um Barão de Münchausen não o teria feito melhor. Dizíamos que a caça, como também a pesca, tão proibidos em nossa antiga pátria, eram aqui livremente exercidas. Escrevíamos que não se pagava pelo ensino, nem contas de médico, nem imposto. Mas não os informamos que nada disso tinha. A caça e pesca eram muito escassas, escolas e médicos aqui não existiam.
Isso fez com que muita gente viesse pra cá. Incluindo os meus Fendrich, certo?
Os Fendrich, Schadeck, Tschöke, Knittel e outros.
E qual foi a reação deles ao ver que a cidade não era como pintavam?
A maioria dos que deixaram se atrair pelos nossos relatos e informações ficou um tanto decepcionada quando viu o nosso paraíso. Voltar não lhes era possível, pela falta de meios. Portanto, começaram o trabalho, iniciaram a mesma vida que nós, os chamados "velhos", e em breve também a eles tudo era sorriso.
Mas a situação melhorou. Vocês até fizeram uma escola, bastante rudimentar.
O essencial era que havia uma escola. Não queríamos ver crescer os nossos filhos como analfabetos.
Como os próprios imigrantes, imagino.
Os imigrantes eram, em sua maioria, analfabetos, sem qualquer cultura, e de uma completa ignorância nos casos de doença.
Apesar das dificuldades, vocês são conhecidos pela alegria e pela música.
Um dos traços predominantes da nossa gente é um grande amor ao canto, à música, às festas alegres, e esta predileção sempre se tem manifestado em nossa vida, não obstante a penúria que tínhamos vivido lá, na longínqua Áustria. E nem aqui, em plena selva, deixamos que se empanasse este nosso predicado.
E a São Bento de hoje é muito diferente da sua época?
São Bento não é mais a mesma dos tempos que se passaram. Apareceram os automóveis e as moças se vestem com o apuro da última moda. No entanto, não lhes noto mais a alegria das que conheci no passado, em que tudo na vida era tão simples.
E aquela historia do cônsul fajuto, que cheguei a contar no Evolução? Você enganou São Bento inteira. Não sofreu represália mesmo?
O contrário. Todos ficaram calados, pois os que tinham motivo para riso estavam ao nosso lado, e assim preferiram não tocar mais no assunto, ficando o caso encerrado.
Para terminar, o que tem a dizer sobre a vida no Além?
Peço a todos que quiserem informações mais precisas dessas paragens, e de como será a outra vida, que me enviem os seus endereços e, com todo prazer, lhes farei esse novo relato. Deus os guarde!