Desde 2006 atuando na direção geral do Hospital e Maternidade Sagrada Família, Irmã Beatriz Zanatta passa o cargo à Irmã Nelza Hackbarth, que é de São Bento do Sul. Irmã Beatriz viajará à Itália para participar, sobretudo, de curso na área da pastoral da juventude. Na quarta-feira, durante anúncio da mudança na diretoria, ela nos concedeu a entrevista que segue
"Quanto tempo um pai e uma mãe levam para que seu filho cresça e esteja bem? Diante de uma situação, de um momento de alcoolismo ou de drogas, perde-se tudo, interrompendo um sonho, um projeto de vida. E aí: como o hospital vai dar uma resposta? Nem sempre está ao nosso alcance" (Foto Elvis Lozeiko/Evolução)
EVOLUÇÃO - Irmã Beatriz Zanatta, a senhora está se despedindo de São Bento do Sul - depois de cinco anos comandando o Hospital e Maternidade Sagrada Família. Como foi esse período de trabalho?
BEATRIZ ZANATTA - Foi um momento muito importante da minha vida. Tenho muito a agradecer a todas as pessoas que, de uma forma ou de outra, colaboraram. Foi uma oportunidade única e agradeço muito pela acolhida e pelo respeito.
EVOLUÇÃO - A senhora destacou, em suas explanações, a “participação” da população e do empresariado de São Bento do Sul. Essa é uma das marcas que ficam?
BEATRIZ ZANATTA - Com certeza. Não tenho nenhuma dúvida que essa é uma grande característica de São Bento do Sul. Que Deus abençoe estas pessoas - e que estas pessoas continuem agindo e tendo essas atitudes de solidariedade, como um gesto de partilha. O resultado final, em si, não é para nós, Irmãs, mas para as pessoas que são atendidas no hospital. Se temos melhores condições físicas e de estrutura, quem vai ser atendido? A população que vem procurar os serviços. Sobre a participação da população, há várias formas de parcerias, como a doação de alimentos, por exemplo - o que melhora a nossa alimentação. Seria injusto eu citar os nomes apenas de algumas pessoas! Até no anonimato às vezes as pessoas ajudaram.
EVOLUÇÃO - E em relação aos governos? A senhora passou por duas administrações municipais...
BEATRIZ ZANATTA - Sempre é um desafio. A Saúde nunca é tão tranquila quanto a gente possa imaginar. Não tivemos dificuldades de relacionamento nem com prefeitos nem com secretários. É importante frisar que a Saúde tem um custo muito alto. Então, é preciso buscar sempre mais.
EVOLUÇÃO - A tabela do SUS está há dezessete anos sem um reajuste adequado!? É difícil trabalhar dessa maneira, certo?
BEATRIZ ZANATTA - Muitas coisas do dia a dia às vezes não conseguimos realizar por falta de recursos financeiros. Às vezes trabalhamos hoje com o operacional, sem podermos pensar no amanhã. Se o SUS pagasse o custo da conta, muitas vezes talvez não estaríamos fazendo rifas ou bingos, ou mesmo pedindo para as pessoas contribuírem com a instituição.
EVOLUÇÃO - O Ministério da Saúde é exigente de um lado, mas não dá uma boa contrapartida por outro!
BEATRIZ ZANATTA - Ele determina a lei - e cumpra-se! Quem está na ponta está obrigado a cumprir, mas não se diz de onde vêm esses recursos ou quem vão ser as pessoas que vão assumir essas responsabilidades. Então, é um grande desafio.
EVOLUÇÃO - Depois destes cinco anos, o que a senhora pode deixar registrado aos nossos leitores como uma das suas grandes realizações no hospital, com a ajuda da sua equipe?
BEATRIZ ZANATTA - É a própria equipe. Tenho que agradecer à construção dessa equipe interna. Tudo aconteceu porque teve uma equipe junto a nós - eu, sozinha, não seria nada. Ninguém é nada sozinho. A construção aconteceu a partir do grupo, da equipe, das pessoas. Ou seja, a parte interna foi sendo trabalhada, foi sendo constituída, fazendo uma equipe coesa e capaz. Podemos investir muito em equipamentos e tecnologia, mas, se não tivermos os recursos humanos, nada terá resultado. Trabalhamos com pessoas que cuidam de pessoas. Nesses últimos anos - de modo especial no ano passado -, investimos bastante na formação humana.
EVOLUÇÃO - Além do gerenciamento administrativo, do gerenciamento financeiro do hospital, o próprio hospital, no dia a dia, tem inúmeros outros problemas. Afinal, estamos falando de saúde, de vida, de morte - e ninguém vai ao hospital porque quer, e sim porque precisa. Como é administrar esses conflitos do dia a dia?
BEATRIZ ZANATTA - Por isso as pessoas precisam estar bem, né... Quando fazemos com a nossa força humana, não alcançamos muitas vezes (...), mas quando nos deixamos ser conduzidos pela ação de Deus, o projeto é outro, o processo é outro. Diante da dor do outro, não existem palavras; existe um gesto de carinho, de atenção - e entregamos na mão de Deus através da oração. Há situações em que as pessoas vêm ao hospital por conta da doença em si, em outras devido a acidentes, em outras por causa da criminalidade. Em São Bento isso tem crescido muito. Quanto tempo um pai e uma mãe levam para que seu filho cresça e esteja bem? Diante de uma situação, de um momento de alcoolismo ou de drogas, perde-se tudo, interrompendo um sonho, um projeto de vida. E aí: como o hospital vai dar uma resposta? Nem sempre está ao nosso alcance. É uma situação que não foi construída do hospital - ela chegou dentro do hospital.
EVOLUÇÃO - A senhora está indo a Roma. Do que se trata essa missão, esse trabalho?
BEATRIZ ZANATTA - Esse é um momento de estudo. Primeiro vou estudar italiano em Curitiba, onde fico até final de julho. Provavelmente viajamos à Itália no final de agosto, pois as aulas lá devem começar no final de setembro.
EVOLUÇÃO - A senhora é descendente de italianos...
BEATRIZ ZANATTA - Sou descendente de italianos, mas não parlo italiano - então preciso aprender muito. Nesse momento serão dois anos na Itália. O curso principal acontecerá na Universidade Salesiana, mas também faremos outros cursos na área de espiritualidade e na área de formação religiosa em outras universidades. O nosso principal curso acontecerá na área da pastoral da juventude.
EVOLUÇÃO - O que dizer à Irmã Nelza, que está vindo substituí-la?
BEATRIZ ZANATTA - Boas vindas para a Irmã Nelza. Ela é de São Bento do Sul, então conhece bem a cidade, conhece as pessoas. Já trabalhamos muitas vezes juntas. Temos uma afinidade grande em termos de projetos. Claro: quando chega alguém novo, essa pessoa tem um novo perfil também e deve fazer algumas mudanças - inclusive acho isso muito importante. Essas mudanças fazem bem às pessoas, à população é à própria instituição.
EVOLUÇÃO - Obrigado pela entrevista, Irmã. Algo mais?
BEATRIZ ZANATTA - Quero deixar uma mensagem, através desta frase. Acho que ela é importante para a vida das pessoas, porque a nossa vida não está pronta. "Que cada minuto seja único e exclusivo, porque o tempo passa. Ele é precioso. Nossa história é construída juntando cada segundo de vida. Depende apenas de nós fazer com o que final seja grandioso".
EVOLUÇÃO - Essa frase é sua?
BEATRIZ ZANATTA - Essa frase ganhei no dia de um aniversário. Não sei quem é o autor. Mas quero dizer que quero partilhá-la, porque ela tem ajudado muito no sentido da construção do presente. Por fim: é Deus quem conduz a nossa história.