Henrique Fendrich (Crônica de São Bento)
Jornalista são-bentense residindo em Brasília/DF
“E esse negócio de dar dinheiro para pastor?”. Ele ri da pergunta, com a qual já está habituado – sabe que nada há de mais sagrado no mundo que o dinheiro. E pacientemente explica os princípios do dízimo e da oferta à luz da Bíblia. Lembra ainda dos projetos sociais – sua igreja mantém mais creches do que o Governo, além das casas de recuperação para drogados. Nela pastor não ganha salário e precisa trabalhar fora para se sustentar. E ninguém vira pastor da noite para o dia: antes é preciso ser discípulo, líder de célula e diácono, etapas com exigências tão rigorosas que apenas depois de anos de preparação se concede o título de pastor.
Ele mesmo é ainda um líder de célula. Todos os sábados reúne um grupo de jovens como ele para falar sobre Jesus. Essa reunião acontece na casa de um deles, o que parece diminuir a resistência de quem não frequenta igrejas evangélicas. Consegue prender a atenção dos adolescentes falando a mesma linguagem que eles e abordando situações típicas de suas vidas. Além dos momentos de oração, há outro em que cada um escreve o que gostaria de pedir ao próprio Deus. Durante a semana, ora-se sobre os pedidos. Quem foi atendido dá o seu testemunho no encontro seguinte. Ao final, há uma confraternização com lanchinho.
Na noite de sábado acontece o culto dos jovens. É com grande animação que participam da primeira parte, composta por canções de louvor e adoração. Durante a pregação, também apropriada para eles, a maioria anota em cadernos as partes mais importantes.
Às acusações de que as igrejas fazem lavagem cerebral, eles respondem com um bispo, fundador da igreja, que é físico nuclear, amante da ciência e grande incentivador do hábito da leitura. Sua esposa tem três formações superiores e sempre ressaltou a importância do estudo para os evangélicos. Foi este o bispo, inclusive, convidado pelo Jean Willys para um seminário sobre homofobia. Mas quem não adota posições extremadas tampouco vira notícia.
Dois altares
Por instinto, tiro o boné quando adentro na Igreja do Rosário dos Pretos de São Benedito, em Curitiba. É uma pequena construção em estilo barroco, mas a arquitetura antiga e a simplicidade da igreja não deixam adivinhar as tecnologias que existem do lado de dentro. Nos dois lados do altar há telas grandes que exibem as intenções do dia. Não é mais necessário que alguém as diga uma por uma. Agora basta que ergam a cabeça e leiam, o que deve ter facilitado para o próprio Deus, que caso perca alguma pode vê-la repetida na tela dali a pouco. Um rosário era rezado, mas fiquei com a impressão de que fosse gravação.
Seu altar não me causa maior comoção do que aqueles que estão no Memorial de Curitiba. São dois altares retábulos feitos de cedro maciço que estiveram nas laterais da matriz de Curitiba entre os anos de 1780-1876. A data me impressiona, porque significa que há mais de 200 anos, quando entravam na igreja, os meus antepassados vislumbravam e contemplavam estes mesmos retábulos que hoje eu tenho a oportunidade de vislumbrar e contemplar.
Num mundo que se transforma tão rápido e em que o presente engole tão ferozmente o passado, não deixa de ser uma experiência impressionante.