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PREÂMBULO

Quarta, 20 de fevereiro de 2019

 

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 Tinha o hábito perturbador de ficar quieto em um canto ainda mais escuro na noite escura, despercebido, mimetizado às sombras que o ocultavam.

Tinha a capacidade de reduzir sua aura ainda mais, o que praticamente impossibilitava sentir sua presença por alguma forma que estivesse além dos cinco sentidos humanos.

Ainda assim irradiava muito sutilmente uma espécie de energia envoltória, uma espécie de energia antiga que atestava que não pertencia ao mundo moderno. Ou que não poderia pertencer a ele.

Seus olhos estavam sempre vigilantes, constantemente à deriva, como se estivessem procurando eternamente por alguma coisa.

Imóvel, sua imagem imperceptível se fundia com o que estivesse atrás dele. Se fosse olhado diretamente, ele não estava lá.

Mas, se olhado de uma maneira indireta, quase que com o canto dos olhos, alguns poderiam perceber por alguns momentos o formato de seu vulto inumano que se desvaneceria no instante seguinte, deixando apenas uma impressão de total incerteza e dúvida do que se teria visto.

Alguns animais, principalmente cachorros e gatos, tinham o privilégio de vê-lo. Talvez senti-lo. Porque olhavam momentaneamente para onde ele estivesse e o balançar das caudas atestavam que ele era bem vindo.

Outros, com humanos, era diferente.

Alguns – a imensa maioria: maus – o sentiam inexplicavelmente com um arrepio desconfortável no mais fundo da alma, como se ainda tivessem uma. Outros – a imensa minoria: bons – o sentiam como um alento inexplicável por justiça e esperança.

 

 

Do Livro Bíblico da Revelação ou Apocalipse:

Os quatro cavaleiros do Apocalipse são a Peste, a Guerra, a Fome e a Morte.

O quinto cavaleiro – criado neste livro – poderia ser denominado talvez o Samaritano. Ou, talvez mais apropriadamente, o Diferencial, aquele que faz a diferença. Ou, talvez, a Retaliação. Ou, mais apropriadamente ainda, A Estátua de Sal.

Por que? Você o saberá ao terminar de ler este livro.

Se houver justiça, piedade e solidariedade no mundo, no nosso mundo, onde estarão elas?

E quem se importa?

 

 

Esta é a história de um homem que tinha a coragem suicida de tentar fazer o que era certo. De fazer o que julgava ser certo. Dos motivos que o levaram a isso e dos conflitos que daí surgiram.

Muitos capítulos de meus dois livros anteriores são nele reapresentados parcialmente por uma necessidade de desenvolvimento deste terceiro, para que quem ainda não os leu tenha compreensão do que se segue.

Este livro também fala de Deus de forma não religiosa. E nem poderia ser diferente. Mas você irá encontra-Lo em quase todas as páginas. Sinta-O, sobretudo, com o coração.

Dedico-o para todos aqueles que também têm a coragem de defender seus sonhos, mesmo sabendo que podem morrer fazendo isso.

 

I

COMO TUDO COMEÇOU

Por um momento ficou imóvel, no primeiro degrau da escadaria.

Deixou o olhar perder-se ao longe, não se detendo em nada de especial. Seu pensamento, de uma maneira estranha, deixara de trabalhar conscientemente. Passou as mãos pelo rosto, como se assim pudesse sair daquele torpor em que estava mergulhado.

Começou a descer os degraus lentamente. Surpreendeu-se imaginando o que estaria acontecendo no interior das casas assinaladas pelas pálidas luzes à distância. Em toda aquela miséria, o que estaria acontecendo de bom? E de ruim?

Não, não importava realmente. Acabou de descer mecanicamente o último degrau e, em sua indiferença, nem se deu ao trabalho de sacudir os ombros. Não importava, nada importava.

Começou a caminhar no silêncio da noite, pelas ruas escuras e sem vida. O vento frio açoitava a tudo, e como num delírio, quase podia ver as próprias paredes dos melancólicos edifícios estremecerem sob as lufadas.

Colocou as mãos nos bolsos do casaco, procurando aquecê-las um pouco, os saltos de seus sapatos ecoavam lugubremente pelas calçadas das ruas vazias.

- Aonde vai a esta hora, nesta noite, neste frio, Desconhecido?

Voltou-se, sobressaltado com a voz inesperada às suas costas. Como num sonho, um grande pássaro, de penas negras como a noite, pousou em seu ombro.

- Aonde vai a esta hora, nesta noite, neste frio, Desconhecido? – repetiu.

Atônito, como se fosse outra pessoa, ouviu sua resposta:

- Vou à procura do calor de um amor. Vou à procura da verdade, da vida, e de uma motivação.

O pássaro riu, e a noite ainda se fez mais fria, mais deserta.

- E quem é você para encontrar o que procura?

- Eu sou...

Calou-se, consciente da inutilidade do que poderia responder. Balançou tristemente a cabeça, sentindo um grande vazio.

- Não sabe? – perguntou o pássaro.

- Não, não sei. – confessou. – Esta é uma pergunta cuja resposta também estou procurando.

O pássaro o olhou por um instante, e momentaneamente, no negro de suas pupilas, tremulou uma luz de zombaria.

- Procura-a assim como milhares já a buscaram, e nada encontraram. Diga-me: espera encontrar as respostas para as suas perguntas, para as suas dúvidas, justamente nesta noite gelada e sem vida? Espera solucionar os seus problemas caminhando solitário pela vida, esperando que algo aconteça para mudar o que lhe parece imutável como o tempo que passou?

Um sorriso triste arqueou os lábios do interrogado.

- E por que não? Durante incontáveis dias e infindáveis noites eu procurei minhas respostas, e nada encontrei. Não será você, pássaro falante, quem me dará as respostas que busco há tanto tempo?

O pássaro riu novamente, mas nada respondeu. O homem continuou:

- Quem é você, pássaro que fala? E por que surgiu em meu caminho, se não vai modificá-lo?

A escuridão agora era total. As últimas casas há muito haviam ficado para trás. O pássaro só então respondeu, numa voz profunda e velha como o tempo:

- Eu sou o que sou. E você é o que é. Tens um nome, tens pais, tens família. Tens documentos que podem dizer tudo sobre quem é você. Tens um nome e tens tantas outras coisas que falam de você, mas nada valem, porque não dizem o que você é, o que você pensa, o que você sente. Eu poderia chamá-lo por seu nome, assim como você poderia chamar-me pelo meu. Mas isto nada diria um para o outro. Chamo-lhe "Desconhecido". Pode chamar-me "Pássaro da Noite".

- Não o compreendo...

O pássaro riu.

- Claro que não me compreendes. Minha compreensão está muito além de sua limitação, mortal.

- Quem é você? – insistiu.

- Como eu disse, eu sou o que sou. Assim como você é o que é.

- Mas... Eu não sei nem ao menos o que sou...

- Sei disso. Caso contrário, não estaria a caminhar agora nesta noite fria, conversando com um pássaro que você não sabe se existe ou se é fruto de sua imaginação.

- Não, pelo menos isto eu sei. Sei que você é real, apesar de eu nunca ter conhecimento que um pássaro falasse. Posso senti-lo no meu ombro, e posso conversar com você.

O pássaro içou voo, e o homem teve medo que ele fosse embora.

- Não, não vá embora. – suplicou.

O pássaro tornou a pousar em seu ombro.

- Não tema, não irei embora. Pelo menos, não tão já. Há milênios que não tenho ninguém com quem possa dialogar, e isso, para mim, é importante. Assim como você, eu também, de alguma maneira, procuro respostas para minhas perguntas. E por mais que eu voe, por mais que eu procure, nada encontro.

Havia um tom de tristeza na voz do pássaro. O homem nada disse, e ele continuou:

- Ao longo dos séculos, eu tenho procurado a verdade. E tudo continua assustadoramente igual. As necessidades básicas do homem continuam sendo as mesmas, assim como permanecem inalteradas as suas limitações.

- Não o compreendo.

Houve um momento de silêncio. O homem, levando o pássaro em seu ombro, sentou-se em uma grande pedra de onde ficou olhando tristemente a cidade que dormia abaixo. Quantos choros não haveriam ali? Quanta miséria, quantas aflições, quantas angústias e lágrimas?

A voz do pássaro tirou o homem de suas reflexões.

- Não me compreende, e no entanto... Bom, recomecemos tudo outra vez. Aonde vai a esta hora, nesta noite, neste frio, Desconhecido?

- Vou à procura do calor de um amor. Vou à procura da verdade, da vida, e de uma motivação.

- Vais à procura do calor de um amor? És só? Isto é mau, Desconhecido. Precisas ter alguém em que possa confiar, alguém que o acompanhe pela vida. Nada estará totalmente ruim se você tiver alguém com quem possa realmente contar, nos bons e maus momentos, nas alegrias e nas tristezas. Vais à procura da verdade? E o que é a verdade? Vais à procura da vida? E o que é a vida? Vais à procura de uma motivação?

O homem pensou um pouco, antes de responder.

- O que é a verdade? Não o sei. O que é a vida? Também não o sei. Vou à procura de uma motivação? Sim, vou a procura de uma motivação. Tenho de encontrar alguma coisa de infinito, alguma coisa totalmente perfeita, e a ela me ligar. Talvez não exista nada exatamente assim. Não importa, basta que eu assim a considere. Preciso desesperadamente de um motivo, de um sentido para a minha vida. Preciso saber por que não posso ser feliz, se sempre procurei ser bom e humano, se sempre pensei nos outros antes de pensar em mim mesmo. Preciso saber por que ninguém deixa que eu seja feliz, se com uma simples palavra, uma pequena ação, eu não teria a necessidade de sair às ruas na solidão de uma noite fria e escura.

As pupilas do pássaro, desta vez, emitiam uma luz de piedade, não de escárnio como da primeira vez.

- Eu sei, assim como você existem muitos. A vida é assim, Desconhecido. Quando o encontrei, na solidão de meus caminhos, tive a esperança de que alguma coisa houvesse mudado nestes milênios. Eu me enganei. Tudo continua a ser o que era e sempre será assim. Não é o amor que faz o mundo girar, meu amigo, é o egoísmo dos homens. Cada um continuará indefinidamente a tratar dos interesses exclusivos, a pensar só em si, e a não permitir que os outros tenham o que ele nunca teve ou possuiu. Cada um continuará a não reconhecer o valor de uma verdadeira amizade, e não admitirá que outros a tenham. Cada um continuará a lançar as sementes da discórdia, da mesquinhez e da destruição. Cada um continuará a pensar só em si, sem se lembrar que poderia contribuir para a felicidade dos outros e de si próprio. O mundo não mudou, meu amigo, e nem mudará. Volte para sua casa, não perca o seu tempo. As respostas para as suas perguntas, que também são as minhas perguntas, não existem. Infelizmente, é assim. Não é culpa da vida, os homens é que a fizeram assim. Adeus.

O pássaro abriu as asas, e seus olhos estavam brilhantes.

- Não, espere. – suplicou o homem. – Antes de ir, diga-me como poderei viver, se minhas perguntas não tem razão de ser, se não existem soluções para os meus problemas.

O Pássaro da Noite, antes de se perder ao longe, respondeu :

- Procure uma luz para guiá-lo na escuridão. Procure alguém a quem você possa se dedicar. Procure faze-lo feliz, e você o será também. Lembre-se que a rosa é a mais linda das flores, mas se você não for um jardineiro competente, dentro em pouco ela morrerá em suas mãos. Você receberá uma rosa ainda botão, que desabrochará sob o cuidado do seu amor. Mas não se esqueça, não deixe de se dedicar a ela nas mais pequeninas e sem importância coisas que lhe possam parecer. Dia chegará que você se verá com umas poucas pétalas secas e mortas em suas mãos. E não adiantará se lamentar pelo que passou e você já perdeu. Faça alguém objeto de seu amor. Se não o puder, faça-o de sua amizade. Mas faça-o. Veja o que falta em você, e procure dá-lo a este alguém. É uma verdade que muitos poucos compreendem: tens que dar, antes de receber. Tens que dar, sem pedir e sem esperar nada em troca. Tens que dar a si mesmo, antes de receber alguma coisa. Mas valerá a pena, porque a felicidade que receberás não tem preço, vale muito mais do que tudo aquilo que dedicaste.

- Mas, e se eu não puder mudar nada? E se eu não tiver mais nada que possa ser mudado?

O pássaro sorriu tristemente.

- Você se engana. Sempre haverá alguma coisa que possa ser mudada. Só o tempo que passou é imutável. O nosso amanhã depende apenas de nós mesmos. Bom ou mau, nós podemos mudá-lo. Talvez o preço a ser pago seja muito alto, mas em certos casos, isto não faz muita diferença. Muitas coisas, muitos fatos, deixam de ter seus sentidos normais, e ganham novas, ilimitadas dimensões. O certo e o errado ganham novos significados. O que importa realmente é a nossa felicidade, e o bem dela que possamos ofertar a quem necessite. Se um dia você sentir que chegou ao fim do caminho, que nada mais lhe resta, que nunca mais você será feliz, ainda assim você poderá seguir adiante. Dedique-se a alguém, seja para tentar recuperar o que já perdeu, seja para conquistar uma nova cidadela, uma nova vida. Dependerá apenas de você mudar o seu destino, para o melhor ou para o pior. Você terá que lutar pelas coisas que acredita, mesmo que isto lhe custe a própria vida, está entendendo? Você terá que vencer o seu medo, e enfrentar o desconhecido. Bom ou mau, você terá que enfrentá-lo. Se sentir que um dia irá fraquejar, ou que está fraquejando, lembre-se que é por sua felicidade que você está lutando, e você vencerá. Seja realmente egoísta uma única vez, e pense apenas em você. Você poderá não ser compreendido por muitos, mas os poucos que o compreenderem, saberão que o motivo pelo qual você luta é o mais nobre de todos: alcançar a felicidade para partilhá-la com outro. Sim, porque não existe uma felicidade a um, não há razão de ser assim. Vai ser uma luta inglórita, e muitos poucos, ou ninguém, estará a seu lado. Mas siga em frente, busque forças no tudo o que você já passou. Que todos aqueles sofrimentos, aquela angústia, lágrimas e solidão de antes, lhe deem forças para que você não passe por eles novamente. Procure uma luz para guiá-lo, e não a perca de vista e nem deixe que a apaguem. É preciso lutar muito para ser feliz, não vou iludi-lo e dizer que não o é preciso. É preciso lutar, lutar muito, mas se você o conseguir, tenha a certeza de que encontrará as respostas que você procura. Assim eu saberei que nossa conversa hoje, nestes milênios em que voo inutilmente, teve o poder de lhe dar uma esperança, o poder de lhe dar uma fé por que lutar, o poder de lhe dar uma melhor compreensão das coisas. Assim eu me sentirei compensado pela inutilidade aparente de minha busca, que um dia, espero, possa você dizer que foi sua.

(continua)



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