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Sentimentos - Fernando Coimbra dos Santos

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"Se eu puder combater só um mal, que seja o da Indiferença".

 


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Flamboyant Florido cap XXVI

Quarta, 17 de outubro de 2018


(continuação)

XXVI

Naquela tarde Dulce (agora para sempre) estava com Letícia junto ao lago, a menina corria feliz chapinhando os pezinhos na água tépida e imóvel.

Não havia uma brisa sequer, mas como inexplicavelmente às vezes acontecia, ondas oceânicas começaram a surgir inconcebivelmente na superfície do lago, ondas que se propagavam suavemente de início, e depois ondas maiores que se quebravam e batiam na margem.

Então, imprevista, surpreendente, voraz, uma grande onda surgiu do nada e arrastou a menininha para as profundezas.

Dulce gritou, atraindo a atenção de Gabriel, que correu para lá sem saber ao certo o que acontecia.

Era tarde demais.

Porque, também surpreendentemente, Dulce havia inconcebivelmente se atirado às águas revoltas e resgatara a pequenina, desmaiada. Ela jazia como uma boneca quebrada nos seus braços.

Então suas forças pareceram faltar, ela caiu pesadamente na grama fofa, mas sem largar sua preciosa menininha.

Gabriel ajoelhou-se, preocupado com Letícia que estava desmaiada.

- O que aconteceu, Dulce?

Ela temia incontrolavelmente, Gabriel não sabia se de frio ou do acontecido. Um medo horroroso transpirava de sua face retorcida.

- Não sei, Gabriel... De repente nosso lago se transformou num monstro, estava levando nossa Letícia para sempre, quase não a alcancei.

Gabriel gritou, chamou enfermeiras que acudiram com cobertores, pediu que as duas fossem levadas para o quarto e recebessem um banho quente.

Quando enfim se viu sozinho diante do lago, olhou-o com o coração tumultuado e bradou:

- O que pensa que está fazendo, meu oceano? Queria matar nossa menininha? Você, que nos trouxe tantas coisas boas, agora virou um monstro sem coração?

Gabriel, inconcebivelmente, ouviu o lago responder com suavidade:

- Não, meu amigo, não havia razão para ter medo. Nossa menininha estava sempre protegida. Mas era uma coisa que precisava acontecer.

Não me pergunte o que, esta resposta você ter que buscar com a Dulce. Então você entenderá. Vá agora. Até outra vez, meu amigo.

As águas revoltas se acalmaram, transmutando-se em águas calmas e serenas como as que um lago sempre deveria ter.

Gabriel nem se despediu, começou a correr, teve um suspiro de alívio quando se viu diante das duas, agora recuperadas. Dulce continuava extremamente pálida. Ele se abraçou à menininha, sem se dar conta conscientemente do que fazia. Ah, como aquela pequenina se tornara importante para ele.

- Estão bem? – perguntou com ansiedade.

Dulce sorriu.

- Sim, meu querido, estamos bem.

Gabriel voltou-se para uma das enfermeiras, segredou-lhe alguma coisa baixinho, ela voltou logo com uma grande barra de chocolate que ele entregou para Letícia.

- Gabriel – protestou Dulce. – Você está estragando a menina. Assim ela nem irá almoçar mais tarde.

Nervoso, ele respondeu com brusquidão:

- Então tire você o chocolate dela.

Dulce sorriu, divertida, não se deixou afetar pelo nervosismo de Gabriel. Então caiu numa risada que ecoou longe.

- Meu Deus, Gabriel. Você precisava ver a sua cara. Será que você tem sempre que ser o defensor dos fracos e oprimidos?

Confuso, ele então se deu conta do que fizera.

- Desculpe, Dulce, perdoe-me, por favor. Vocês estão bem mesmo? Acho que nunca senti tanto medo em minha vida. Não sei como isso foi acontecer.

Ela o olhou com seriedade, o sorriso morreu em seus lábios. Então, como se não soubesse ao certo o que dizer, principiou:

- Gabriel, eu também não sei o que aconteceu. De repente aquele lago se transformou num monstro. Quando dei por mim, eu estava lá dentro d’água, salvando nossa Letícia. Nem pensei no que fazia.

Sopesou devidamente o que sentia, o que tinha a dizer.

- Gabriel, eu sabia que adorava esta menina, só não sabia o quanto. Agora eu sei. O medo que senti de perdê-la me fez ter consciência disso. Ela se tornou um anjo em minha vida, trouxe um sentido para a minha vida. Se eu não fosse tão velha, se eu tivesse outras condições, eu iria embora e a levaria comigo.

Com voz sumida, quase inaudível, Gabriel perguntou:

- Iria embora, Dulce? E levaria nossa Letícia com você?

- Talvez fosse, Gabriel. Mas isso seria antes, tive também esta consciência. Agora, não iria e não irei mais, aqui é o meu lar, aqui sou feliz. Eu não me sinto mais sozinha em minha vida, meu querido. E devo isso a você. E a ela.

Gabriel soltou a respiração que mantivera presa, inconscientemente, com medo da resposta que não queria ouvir. Então entendeu as razões do lago, o seu oceano, um instrumento de Deus escrevendo certo por linhas tortas. Ou escrevendo torto por linhas certas, não o sabia mais. Deus se move por caminhos curiosos, às vezes incompreensíveis.

- Que bom, Dulce.

Não teve mais o que dizer. Sentiu-se de repente cansado, muito cansado. Então ela disse:

- Tive muitas brigas com Deus... mas ele jamais me respondeu nestas horas.

Dulce forçou um sorriso. O humor era uma forma de esconder a ferida.

Difícil era se adaptar à vida sem as pessoas que amava, como Gabriel bem o sabia. Mas ela estava apendendo a fazer isso.

Precisava se redimir com aquela senhora que ali encontrara um sentido para a sua vida. E que, de certa maneira, com certeza, o estava ajudando a demolir mais alguns tijolos do muro em que ele se encerrara.

- Quer também um chocolate, Dulce?

Ela riu, cônscia de seus sentimentos desencontrados. Olhou cúmplice para Letícia, deu-lhe uma piscadela.

- Claro que quero.

(continua)



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