O que quero

Não, não quero o voto. Porque embora o resultado do voto se protraia por quatro anos o teclar a urna é uma questão de segundos, e mesmo quatro anos não passam deles mesmos. Tampouco quero o seu dinheiro. A uma, porque não o posso carregar comigo, a duas, porque o Soberano Deus é providente e nada me deixará faltar. Também não procuro por sexo. Aliás, cheguei onde queria chegar: não quero os corpos, quero as almas. Isto, somente isto me interessa: a sua alma. Primeiro, que quem morreu por você não fui eu, Cléverson, foi Jesus Cristo. Então não posso ter para mim o que a Deus pertence. Ele comprou as almas a preço de sangue. Mas num sentido posso almejar as almas para mim, sem causar ciúmes ao Espírito Santo: no sentido de uma profunda e inabalável amizade. Eu quero ser o seu primeiro da lista. Uma espécie de exclusividade em razão na ordem de prioridade. Assim você poderá ter tantos amigos quantos quiser, mas eu terei de ser o número um. Confesso que sou possessivo. Mas quem chegar a esta intimidade comigo lhe garanto que ponho a minha vida em risco para salvaguardar a sua. Busco o contrário daquilo que o mundo oferece. Porque o mundo põe na vitrina o ter, mas eu quero o ser. Porque se tenho a uma pessoa de certa maneira o que ela tem também passa a ser meu. As personalidades são voláteis e superficiais. Até o sexo que deveria ser um momento de intimidade já não passa de um divertimento. Perdemos a capacidade de falar seriamente. Perdemos a capacidade de nos compromissar. Quando está bom, ficamos, quando deixa de estar bom, damos o fora. Procuro almas que são como uma brisa suave. Almas que transpirem civilidade, urbanidade, afabilidade, serenidade e amor. Se uma mulher seleciona o par por aquilo que ele pode lhe proporcionar, vendeu sua alma por quinquilharias. Por onde andam as almas? Porque atam a si mesmas aos interesses da matéria quando foram feitas para a espiritualidade? A esposa não mais pertence ao esposo, o esposo não mais pertence à esposa, os pais não pertencem aos filhos e os filhos não pertencem aos pais. De quem somos? Para que somos? Não foi por acaso que Aristóteles disse que “a amizade é a mais elevada de todas as virtudes morais”. Ser amigo é alienar o próprio ser, o próprio coração a outrem. Ninguém pode se achegar a mim sem ser meu seguidor. Sim, refiro-me exatamente às minhas obras filosóficas. Quero que as coisas comecem assim: primeiro se é meu seguidor, e com o passar do tempo, a empatia crie a amizade, o que pressupõe um grau de compreensão mais elevado. Porque o filósofo é isto: o profeta da religião racional, um sacerdote, um ministro de algo que é sagrado. Quando você sentir o que sinto, pensar o que penso, adjudicar parte de minha angústia e finitude, estará passando pela iniciação que exijo de meus possíveis amigos. Aprouve-me colocar a qualidade acima da quantidade. Quero isto: sentimento de pertencimento no tempo da não pertença. Opção radical por mim em detrimento de um mundo que se diz cheio de possibilidades. O que lhe ofereço com isto? Eu lhe ofertarei exatamente o que você me oferece. Nossos sentimentos serão recíprocos. O que tenho buscado com a filosofia é isto: luz, muita luz. E é isto o que tento transmitir aos meus contemporâneos. Eu fiz as opções radicais de minha vida crendo que escolhi a melhor parte. Se o que é a melhor parte para mim for a melhor parte para você também, quem sabe a gente não começa um relacionamento!